domingo, 2 de setembro de 2007

PARADOXO


Quanto mais interessante se torna a minha vida, menos interessante me torno!
Pensando - enquanto ainda tenho discernimento suficiente para o fazer-, no tempo - e não foi assim à tanto como isso - em que os dias decorriam serenos e sempre iguais, entre o trabalho, a casa, a família e uns tantos pequenos e insignificantes prazeres, eu era uma pessoa calma, sensata, divertida e deveras interessante (creio, se de crença não passa, valha-me ao menos o facto de ainda manter essa). A desagregação familiar, a perda de referências, o convívio frequente e desorganizado, trouxe-me uma ânsia terrivel pela procura de uma identidade, também ela perdida. E, à medida que descubro novas faces da vida, descubro igualmente uma (in)capacidade de me desdobrar (in)conscientemente em inúmeras pessoas, algumas de rosto brilhante e sorridente, outras desfaceladas e cinzentas. E, entre umas e outras vou ficando uma unidade bem pouco interessante.
É certo que de nada serve sermos pessoas interessantes se nínguem o souber. Mas bem pior é que haja quem saiba o quanto podemos ser desinteressantes.
Tomar consciência da degradação psicológica é algo medonho! Olhamo-nos no espelho da consciência e perguntamo-nos : "espelho, espelho meu, diz-me se haverá alguém mais feio do que eu." Mas não aguardamos pela resposta, pelo sim, pelo não, a dúvida, enquanto persistir, alimenta-nos o ego.
É triste sentirmo-nos miseráveis! Levamos o tempo a interiorizar promessas repetidas de que vamos mudar tudo, mas começaremos o percurso no dia seguinte. E depois, há sempre aquela esperança de que alguém nos há-de lançar a corda para nos tirar do fundo do poço. Sempre será mais fácil do que escalar as paredes! Sempre a ideia de que com a ajuda dos outros seremos bem melhores! Será que não é mais fácil caminharmos carregando apenas as nossas pedras do que esperarmos a ajuda de alguém cujo sapato pode ser maior que o nosso e por isso carregar um peso maior! Quantas vezes, pensando encontrar a salvação para os nossos problemas, acabamos por somar os da outra pessoa aos nossos.
Mas se é impossível ser feliz sózinha, será que é possível ser interessante sózinha? Suponho ser importante estarmos bem com nós mesmos, deitarmos a cabeça na almofada e deslizar por ela com a suavidade de uma pena e então dormir o sono descansado. Uma beleza, não é? Mas heis como pesa a solitária suavidade de uma consciência tranquilamente esquecida dos outros! Quererei dizer com isto que na partilha, no convívio, nos tornamos menos interessantes? Há quem diga que é perante os outros que revelamos aquilo que realmente somos. Sem duvida. Mas as personalidades interagem e influenciam-se. Só somos inteiros sózinhos.
O discurso é deprimente! Levantei-me com a angústia de me saber feia e a certeza de me querer tornar bonita. Não preciso de encontrar o caminho. Conheço-o bem e está mesmo à minha frente. O que preciso é de encontrar a coragem para começar a caminhada. Todavia, sento-me e escrevo e enquanto isso, faço o que rigorosamente tenho vindo a fazer! Fumo cigarros e lamento-me entre suspiros e filosofias, aguardando que se faça noite para apagar novamente!
Como fazer as minhas mãos estenderem-se até às costas e empurrarem-me? Podemos ser tão grandes e vivemos tão pequenos!!!!

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