sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

ESTA INSUSTENTÁVEL NOITE

Foto: Mosteiro dos Jerónimos
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Vou dizer-te que não esperes por mim esta noite. Que não esperes por mim noite alguma. Estou fria. Não sinto que me possas aquecer. Vou entregar-me à castidade como uma solitária devota. Não perguntes porquê, não me obrigues a mentir. E pior será se me obrigares à verdade. É melhor assim. Irás ficar surpreendido, ferido no orgulho macho e sem saber o que fazer com o champanhe que guardas no frigorífico. Depois irás emborcá-lo para afogar o despeito e acabarás sentado no balcão de um bar a beber aguardente velha e a engatar a gaja que estiver mais à mão. É fácil e até tens jeito para a coisa. Dirás que és um homem livre, devoluto e de coração partido. Que eu era uma galdéria e que me mandaste à fava. Não levarás mais que uma hora a inventar todas as coisas terríveis que te fiz e quando já estiveres abaixo de desgracadinho e o coração dela condoído, irás mostrar-lhe como estás carente. Tudo se resolve, verás.


Eu vou dizer-te que não esperes por mim esta noite. Vou enrroscar-me no sofá, perto do aquecedor, embrulhada numa manta como uma velha que já não tem vida. Vou desligar o telefone, ligar a tv e embriegar-me até todos os filmes terminarem. Estou fria. De ti não vem calor que me quebre o gelo. Poderia dizer-te que lamento o nevão que caiu nos nossos braços, mas não quero mentir-te e tu, certamente, não quererás saber a verdade. É bem melhor assim.

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