segunda-feira, 15 de março de 2010

A CONTAR HISTÓRIAS


Pela manhã, quando saía de casa, encontrou-se com um louco. Pressentiu-lhe a presença antes mesmo de o ver. Reconheceu-lhe a voz quando ele, nas suas costas, lhe dirigiu um cumprimento. Nada em si estremeceu ou se abalou! Virou-se serenamente e devolveu-lhe o cumprimento. Nada receou! Ele olhou-a nos olhos. Ela olhou-o nos olhos e viu como a loucura pode ter uma forma. Mas fingiu não conhecer a loucura. Fingir, é muitas vezes, vezes demais, o caminho apropriado para se seguir na vida. Depois colocou os óculos de sol no rosto e preparou-se para caminhar.
- Os seus olhos... - Disse-lhe ele.
- Os meus olhos? - Perguntou-lhe ela.
- Sim, os seus olhos..." - Insistiu ele.
Ela tirou os óculos, inclinou-se para ele, fixou-o de novo nos olhos e perguntou-lhe:
- O que têm os meus olhos?
- Isso pergunto eu, o que têm os seus olhos?
- A final quem é que pergunta? o que é que têm os meus olhos?
- Brilham!... Brilham tanto!
Ela colocou de novo os óculos escuros sobre o rosto e disse:
- Ha! Os meus olhos brilham! Sim, dizem que sim, que os meus olhos brilham. Eu não sei, eu não os vejo. - Comentou enquanto recomeçava a andar.
- E por quem brilham? - Questionou-a dando uns passos no seu encalço.
Ela parou - Não é por quem brilham, é porque brilham. Olhe à sua volta, o que vê para além de mim? Está um sol maravilhoso, um dia deslumbrante e estamos a um passo da Primavera. É preciso haver mais razões?- Fez um circulo de braços abertos.
Seguiu o seu caminho sem mais uma palavra, passos seguros em cima dos saltos altos, o corpo direito, a cabeça levantada, a receber o sol na testa.
Não o podia ver, mas sentia a sua presença. Quando parou na passadeira para atravessar a estrada, lá estava ele a três metros de si, como uma sombra! Ignorou-o e pos-se a pensar que também ela é louca. Que cada um tem o seu grau de loucura. Só que a loucura, na maioria das pessoas é passiva e só em certas pessoas se manifesta activamente.
Ela gostava de perceber porque existem atitudes maníacas em pessoas cuja aparência é verdadeiramente vulgar e não seria previsível. E porque é que há pessoas cuja aparência é invulgar e não são capazes de exceder o meramente previsível.

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Blackout - Muse

Um comentário:

Anônimo disse...

Estás linda.

Milhões de beijos.

Lin Xung