terça-feira, 16 de março de 2010

EXPERIÊNCIAS QUE A VIDA ME DÁ


Eram 11H00 da manhã quando me sentei na sala de espera do consultório do médico. Nos últimos dias é a quarta vez que faço isso. Passei bem a noite, dormi bem. Estava sol e cheirava a Primavera. Tinha tantos pensamentos a assaltarem-me o cérebro! Mas como ando sempre com uma pasta, papel e caneta, fui matando o tempo a anotar os pensamentos. Mandaram-me despir da cintura para cima e deitar numa marquesa. O médico besuntou-me as mamas com gel e começou a percorrê-las com um aparelhometro qualquer que fazia cócegas. Olhava para o monitor enquanto me ia fazendo perguntas. Se o meu periodo era regular, se tinha filhos, etc, etc, etc. A dada altura comecei a notar que a sua expressão facial ia mudando, que se tornava mais séria, até que surgiu a pergunta negra:
- Há antecedentes de cancro da mama na sua família?
- Que eu saiba não. - Respondi.
- Vou repetir o exame. - Disse-me com um ar demasiado sombrio.
Fiquei tensa. Após algum tempo mandou-me levantar e disse-me que tenho quistos laterais em ambas as mamas e que preciso de manter uma vigilância apertada, exames minuciosos, de seis em seis meses. Eu só consegui pensar: "Obrigada Dr. agora estou muito mais animada!"
Não é um drama, mas não é notícia que queiramos ouvir, ainda por cima num dia bonito depois dum tenebroso inverno! Quando saí daquele local só queria uma coisa: sentir o sol quente a bater-me no rosto. Dei uns passos e deparei com um pardalito no passeio. Não era bébé, mas não parecia adulto. Deu uns saltinhos, mas não voou. Agachei-me e segurei-o na mão. Fiquei sem saber o que fazer. Estaria perdido? Com fome? Não sei se alguma vez aqui referi, mas tenho o hábito de dar de comer aos pardais e aos pombos, na janela da minha cozinha. Partilho com eles o pequeno almoço. Eu como as códeas do pão e dou-lhes o miolo. Também lhes dou o almoço, arroz cozido, sementes e cereais. E eles estão tão habituados que vêm piar à minha janela. Observoo-os e crio afinidades com eles. Tenho um pardalito atrevido que quase se infiltra na cozinha e há um pombo deficiente de uma pata que é regeitado pelos outros e protegido por mim. E, por via disso, fiquei preocupada com o pardalito. Estaria magoado? Não sei. O que sei é que ele não me fugiu e ficou quietinho, aconchegado na minha mão. O que não é vulgar. Do outro lado da estrada havia um lote de terreno cheio de ervas e uma árvore. Ouviam-se pássaros. Pensei deixá-lo junto com os outros, na esperança que lhes dessem de comer ou o ajudassem. Atravessei a estrada, segui pelo terreno e junto á árvore agachei-me para o colocar no chão. Abri a mão, mas o pardalito não saltou, mexeu a cabeça de um lado para o outro e nada de se pirar! Fiz-lhe umas festinhas com o dedo e falei com ele. Nada! O gajo estava a gostar! Eu própria já me sentia perdida sem saber o que fazer com o animal! Não queria abandoná-lo, só queria que ele ficasse bem. Com cuidado coloquei-o no chão, fiz-lhe um carinho na cabecita com a ponta do dedo e disse-lhe: "Não te preocupes, os teus amigos hão-de dar-te de comer e tu hás-de sobreviver e aprender a voar. Nisto, ele abriu as asas e voou para longe! E eu fiquei ali, agachada, a vê-lo desaparecer sem saber o que pensar. E comecei a chorar. Não era de tristeza, nem de alegria, nem de nada. Apenas não sabia o que pensar. Não sabia. Penso que há coisas que se passam comigo que não sei porquê, que sentido lhes dar, que significados lhes atribuir.
Afinal o pardalito só queria um mimo!

Há alturas em que precisamos de um mimo! Um bocadinho de aconchego numas mãos quentes, umas festinhas, para, enfim, podermos voar!

Depois segui para casa ao volante do meu modesto automóvel, enquanto as lágrimas me escorriam pelo rosto silenciosamente. E voltei à rotina habitual a fingir que tudo estava no lugar de sempre. Porque fingir também passa a ser rotina.
A meio da tarde telefonou-me um amigo e estivemos horas na conversa, a desanuviar, o que foi muito compensador. Chegada a casa recebi mais uma chamada de um outro amigo que me pos a sorrir durante algum tempo. Depois apareceu aqui uma velha amiga que veio trazer-me um trabalho e fazer-me companhia. Já passava das 9H30 quando fiz o meu prato, caprichado. Fui à garrafeira, agarrei uma reserva de Cabriz 2004 e abria. Depois sentei-me sobre os joelhos, como habitualmente, e jantei lenta e deliciosamente na pequena mesa da sala, em frente à televisão. Porque a vida é curta e temos de nos mimar. Ninguém o fará por nós. Mas é bom sabermos que não estamos sós nos períodos mais críticos, que os amigos aparecem sem que os chamemos.

Porque será que sempre me senti um soldado de chumbo e agora me sinto uma bailarina?
.
What it's like - Arthur Russel





3 comentários:

xeltox disse...

Espinhos:


Não posso dar-te um abraço para teres força, mas posso gritar, daqui, mesmo que não me oiças, tem fé e esperança, vai tudo correr muito bem!!!


Bjos, Xeltox.

espinhos e outras flores disse...

Obrigada Xeltox. As tuas palavras chegaram e eu ouvi-as e guardei-as no lado esquerdo do peito. Vai tudo correr muito bem.
Afinal de contas eu sou a pessoa mais óptimista que conheci em toda a minha vida e isso não vai mudar.

Um beijo bem grande.

Anônimo disse...

Diz-me que não compreendi bem o que acabei de ler senão, corro o risco de ter um ataque cardíaco.

Não quero saber e vais ao médico, se vais ao astólogo ou ao bruxo mas, alguma coisa precisas de fazer.

Um milhão de beijos.

Ling Xung